Na minha infância havia umas pistolas de brincar que eram
carregadas com rolos de papel. Estes brinquedos (?!) simulavam tiros reais e
chegavam a fazer fumarada. Tratavam-se de réplicas tão reais que foram um
sucesso, sobretudo no Carnaval, como complemento de uma máscara de cowboy.
“O amor que enlouquece e permite que se abram intercadências
de luz no espírito, para que a saudade rebrilhe na escuridão da demência, é
incomparavelmente mais funesto que o amor fulminante”. – Camilo Castelo Branco
Não era nada disto que procurava quando procurei no browser mais próximo a definição para a
palavra fulminante, mas agora que penso nisso, talvez não deixe de fazer sentido, ainda que de uma forma rebuscada
e irónica, se, no mundo do futebol, falarmos de promessas adiadas, jogadores
que não se adaptaram, ou em fase de assimilação de processos, blá, blá. Os
chamados flops.
Chegam envoltos em papel de embrulho, colorido e elegante,
fazendo palpitar de expectativa renovada os adeptos dos seus clubes, e o amor
acontece. À primeira vista o algodão não engana. “Isto é material do bom. Vão
por mim que sou bombeiro!” Podia dizer o vendedor de banha da cobra, habituado
a engodar em dias de pesca falada. Por respeito ao sujeito humano e á etiqueta
que traz colada no corpo, profere-se frase mais escorreita e politicamente
correcta, para não espantar o lucro. “Este é craque. Jogador dedicado e com
muita força de vontade…”
Depois é que são elas, que é como quem diz, eles. Passam-se
semanas, sucedem-se as jornadas, os jogos, as temporadas e das promessas não se
vislumbra coisa válida que satisfaça a saciedade. Diz que é o treinador, que
são as lesões, talvez seja dos pés, da cabeça de dentro ou da que sustenta o
penteado. O certo é que esse amor fulminante, que enlouquece e que abre
“intercadências de luz”, cedo perde a sua chama a pontos de se dar ao
apagamento definitivo até as trevas revolverem de impaciência as vísceras dos
adeptos e a ilusão dar lugar ao esquecimento.
Quantos se lembrarão ainda de um tal de Adrián Lopez, internacional espanhol proveniente da destinta casta Colchonera que no Verão passado aterrou
no Olival… e nunca mais foi visto? Na dúvida, talento adiado (“Vão por mim que
sou bombeiro”) mas nunca pé de chumbo, que aqueles pés custaram ouro (€11M).
Simeon Slavchev. Quem? Costuma ser visto em Alcochete,
em dias de treino. O médio búlgaro por quem Bruno de Carvalho se dispôs a pagar
€2,5M por 85% do passe, prometia ser aposta séria em tempo de vacas magras.
Arrependido andará por estes dias o presidente leonino por não ter adquirido os
15% correspondentes aos pés do craque.
Insistindo numa sequela muito batida, o Benfica voltou a
alegrar o defeso com a contratação de mais um lateral esquerdo. Em seis épocas
de consulado, Jesus conseguia arregimentar um plantel só à custa de defesas
canhestros. Benito. Este menino
bonito virou patinho feio e palpita-me que nem o beijo de uma princesa lhe vai
devolver a aura.
Neste Carnaval de fulminantes, nenhum clube se fica a
rir. Todos gostam de foguetório e a tendência para andar aos tiros com pólvora
seca não se limita aos exemplos indicados. Muito haveria para dizer de Derleys,
Sackos, Campañas e outros artigos de fundo de catálogo, com mais jeito para
cadernetas de cromos desbotados do que para enfeitiçar de amor pungente o mais
inocente dos adeptos. Mau é o agoiro, agora que o dinheiro é cada vez mais de
menos para molhar os bolsos dos vendedores de banha da cobra e daqueles que
lhes aparam o jogo.
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