terça-feira, 28 de abril de 2015

Liga dos Fulminantes

Na minha infância havia umas pistolas de brincar que eram carregadas com rolos de papel. Estes brinquedos (?!) simulavam tiros reais e chegavam a fazer fumarada. Tratavam-se de réplicas tão reais que foram um sucesso, sobretudo no Carnaval, como complemento de uma máscara de cowboy.

“O amor que enlouquece e permite que se abram intercadências de luz no espírito, para que a saudade rebrilhe na escuridão da demência, é incomparavelmente mais funesto que o amor fulminante”. – Camilo Castelo Branco

Não era nada disto que procurava quando procurei no browser mais próximo a definição para a palavra fulminante, mas agora que penso nisso, talvez não deixe de fazer sentido, ainda que de uma forma rebuscada e irónica, se, no mundo do futebol, falarmos de promessas adiadas, jogadores que não se adaptaram, ou em fase de assimilação de processos, blá, blá. Os chamados flops.

Chegam envoltos em papel de embrulho, colorido e elegante, fazendo palpitar de expectativa renovada os adeptos dos seus clubes, e o amor acontece. À primeira vista o algodão não engana. “Isto é material do bom. Vão por mim que sou bombeiro!” Podia dizer o vendedor de banha da cobra, habituado a engodar em dias de pesca falada. Por respeito ao sujeito humano e á etiqueta que traz colada no corpo, profere-se frase mais escorreita e politicamente correcta, para não espantar o lucro. “Este é craque. Jogador dedicado e com muita força de vontade…”

Depois é que são elas, que é como quem diz, eles. Passam-se semanas, sucedem-se as jornadas, os jogos, as temporadas e das promessas não se vislumbra coisa válida que satisfaça a saciedade. Diz que é o treinador, que são as lesões, talvez seja dos pés, da cabeça de dentro ou da que sustenta o penteado. O certo é que esse amor fulminante, que enlouquece e que abre “intercadências de luz”, cedo perde a sua chama a pontos de se dar ao apagamento definitivo até as trevas revolverem de impaciência as vísceras dos adeptos e a ilusão dar lugar ao esquecimento.

Quantos se lembrarão ainda de um tal de Adrián Lopez, internacional espanhol proveniente da destinta casta Colchonera que no Verão passado aterrou no Olival… e nunca mais foi visto? Na dúvida, talento adiado (“Vão por mim que sou bombeiro”) mas nunca pé de chumbo, que aqueles pés custaram ouro (€11M).

Simeon Slavchev. Quem? Costuma ser visto em Alcochete, em dias de treino. O médio búlgaro por quem Bruno de Carvalho se dispôs a pagar €2,5M por 85% do passe, prometia ser aposta séria em tempo de vacas magras. Arrependido andará por estes dias o presidente leonino por não ter adquirido os 15% correspondentes aos pés do craque.

Insistindo numa sequela muito batida, o Benfica voltou a alegrar o defeso com a contratação de mais um lateral esquerdo. Em seis épocas de consulado, Jesus conseguia arregimentar um plantel só à custa de defesas canhestros. Benito. Este menino bonito virou patinho feio e palpita-me que nem o beijo de uma princesa lhe vai devolver a aura.

Neste Carnaval de fulminantes, nenhum clube se fica a rir. Todos gostam de foguetório e a tendência para andar aos tiros com pólvora seca não se limita aos exemplos indicados. Muito haveria para dizer de Derleys, Sackos, Campañas e outros artigos de fundo de catálogo, com mais jeito para cadernetas de cromos desbotados do que para enfeitiçar de amor pungente o mais inocente dos adeptos. Mau é o agoiro, agora que o dinheiro é cada vez mais de menos para molhar os bolsos dos vendedores de banha da cobra e daqueles que lhes aparam o jogo. 

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