Final da Liga dos Campeões. Barcelona contra… os coisos. Na praceta que dá para as traseiras, um punhado de miúdos entretém-se a jogar à bola, sobre a calçada e por entre os canteiros de árvores débeis, numa versão moderna das peladinhas de outros tempos. Talvez acabem o jogo. Assim o queiram as consolas, à carga.
Sem esperança, volto para dentro e abraço a nostalgia. Na televisão, o Barcelona insiste em tornar-se anacrónico, avançando em contramão com o sentido do jogo actual, espartilhado por teorias físico tácticas e por um léxico formado por basculações, transições defensivas e ofensivas, jogos interiores e sentidos posicionais. (!?)
O Barcelona insiste na recusa do futebol formal, das sombras cinzentas, incapazes de se distinguir de entre a paisagem e traz para dentro do terreno de jogo os vícios saudáveis de uma adolescência remota, partindo da rebeldia e do improviso para a ordem geométrica das coisas sérias.
Lá fora, os putos riem e a bola foge. Alguém corre a resgatar a réplica perfeita da bola oficial, made in Tailândia, enquanto os outros dão uma volta de smartphone.
De regresso à nostalgia. O losango dianteiro do Barcelona (Barça para os amigos ou simplesmente para os que gostam de futebol) é a oitava maravilha do Mundo e temo que esta apreciação só peque por defeito, pois há virtudes a quem Deus não teve tempo de atribuir significado, por distracção ou por intencional diferenciação entre o banal e o soberbo.
Os quatro magníficos, observados de perto por um génio no ocaso da carreira, de seu nome Xavi, deleitam-se em campo, no seu estilo toca e foge. A baliza é já ali. Mas se fosse para ser fácil, Iniesta, Neymar, Luis Suarez e Messi teriam enveredado por um qualquer tacho na FIFA.
Na praceta, se a algum daqueles meninos perguntassem “o que queres ser quando fores grande?” por certo nenhum teria o discernimento de responder: “ser político”. Afinal a seriedade ainda é um dos pilares da educação familiar. Por enquanto jogar á bola parece um passatempo menos pernicioso… Ámen.
Ver Messi do outro lado do ecrã faz lembrar Maradona a partir pedra num distante Mundial no México. Neymar, o puto maravilha, com sorriso malandro de “garoto” de rua, jogando para a plateia e para o próprio umbigo. Suarez, a gazua com o instinto mordaz dos iluminados, jogando com o coração ao pé da boca, de dentes serrados (!) perseguindo o horizonte de glória como se não houvesse amanhã. Last but not least, o pequeno geómetra, de promessa calva, escravo do passe curto, da visão periférica, do movimento perfeito, como se erro fosse uma ameaça à criação. Iniesta, Iniesta. Grande, grande.
Fim do jogo. O Barça venceu os outros e arrecadou mais uma. Na praceta, o dono do jogo arrebanha a bola e parte sem se despedir, de smartphone a tiracolo. “Jogamos outra vez?” Atira alguém. "Logo se vê".
A festa é blaugrana. E de todos aqueles que se recusam a seguir o rebanho. De todos aqueles para quem a nostalgia do futebol puro os aproxima da mais próxima reencarnação dessas memórias.
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